quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

Solução tenta minimizar derrota política

Gerson Camarotti

BRASÍLIA. Para evitar um desgaste político ainda maior, o governo optou pela solução de editar um novo decreto estabelecendo as regras para o projeto de lei que cria a Comissão Nacional da Verdade. A solução foi sugerida na noite de terça-feira pelo ministro da Defesa, Nelson Jobim, e logo aceita pelo ministro Paulo Vannuchi, da Secretaria de Direitos Humanos.
A solução resolveu o impasse entre os militares porque, nesta questão específica, o novo decreto acabou esvaziando o anterior. Em relação aos demais pontos polêmicos do programa Nacional de Direitos Humanos, que provocaram protestos da Igreja Católica, da mídia e do setor agrário, o governo decidiu não mexer no texto, pelo menos neste momento.

Igreja receberá garantias de que governo não defenderá programa
A estratégia definida pelo Palácio do Planalto é de não mexer em mais nada agora, para não evidenciar derrota política diante das pressões dos militares de vários grupos. Mas integrantes do governo avaliam que é possível fazer novas mudanças, como na proposta de apoiar um projeto de lei que legaliza o aborto. As mudanças, no entanto, ocorrerão em outro momento, quando o governo considerar mais adequado. A primeira tentativa é de encerrar a polêmica em torno do projeto, depois de atender aos militares.
A ideia do governo é tentar passar a impressão de que o programa é uma espécie de carta de intenções. O Planalto vai tentar dar garantias para setores como a Igreja de que não haverá qualquer ação concreta do governo em defesa de projetos de lei que estabeleçam o aborto e a união civil de homossexuais, como está previsto no programa.
- Sobre os demais temas, o governo não vai fazer nada agora. Fará no seu tempo, se quiser - explicou um auxiliar do presidente Lula.
A grande preocupação na solução apresentada ontem para a crise é evitar um recuo político do governo. Setores do Planalto chegaram a pressionar por alteração no texto do programa, para esvaziar as propostas polêmicas. Chegou a ser apresentada uma proposta de reeditar o decreto. No novo texto, o decreto diria apenas que o presidente da República divulgava a conclusão da Conferência de Direitos Humanos. Mas essa solução teve forte rejeição de setores petistas dentro do governo e foi descartada.
Ontem, integrantes do governo tentaram passar a imagem de que, com a solução encontrada para os militares, a crise estava encerrada. Na conversa que teve pela manhã com Vannuchi e Jobim, Lula chegou a afirmar que a nova solução expressava o que tinha sido acertado anteriormente. Era uma referência ao fato de, no texto final do programa, ter sido mantida a expressão "repressão política", que causou forte reação dos setores militares. Lula também determinou que a Casa Civil fizesse um pente-fino no texto, para evitar novo erro de redação.
Ao final, a proposta apresentada por Jobim foi discretamente comemorada no Ministério da Defesa. Isso porque a proposta original, que foi descumprida por Vannuchi, era de substituir a expressão "repressão política" por "conflito político". No jargão das Forças Armadas, a mudança de expressão significa que a Comissão da Verdade investigaria não apenas os militares, mas também os militantes da esquerda armada durante a ditadura. Com exclusão do termo e a manutenção apenas da expressão "violação de direitos humanos", o texto ficou genérico e agradou aos militares.

Vannuchi se diz satisfeito e vai ficar no governo
O ministro da Secretaria dos Direitos Humanos, Paulo Vannuchi, também teria ficado satisfeito com a saída encontrada. Vannuchi saiu do encontro com o presidente e reuniu-se com sua equipe de trabalho. Comunicou a criação do grupo de trabalho para elaborar o projeto da comissão e tranquilizou seus auxiliares, que estavam apreensivos quanto à sua possível saída do governo. No final da tarde, ele retomou suas férias e só retornará ao trabalho na semana que vem.
COLABOROU: Evandro Éboli

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